segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Blá-blé-bli-bló-blog

Texto: Enio Moraes Júnior
Imagem: tangaslesbicas.wordpress.com



As atuais tecnologias e suas ferramentas são instrumentos eficazes no processo ensino-aprendizagem. Precisamos apenas aprender esta e outras lições...


Quando Gutenberg criou os tipos móveis no século XV nem de longe imaginava que um dia redimensionaríamos seu invento e o transformaríamos em fluidas letras que acenam nas telas dos computadores. Embora muito já tenhamos escrito e lido sobre a aplicação das tecnologias informacionais e comunicacionais na educação e a utilização da blogosfera nesse contexto, por mais que professores venham fazendo, junto com os seus alunos, experimentações nesse sentido, cada experiência, em cada realidade escolar, traz resultados diferentes. Algumas vezes são respostas muito positivas no processo ensino-aprendizagem, outras vezes, nem tanto. Em todo caso, sempre são aprendizados.
O fato é que há algum tempo vêm sendo realizadas experiências nessa área e, na maior parte das vezes, são confirmadas as vantagens dessas incursões. Do ponto de vista didático, tem chamado atenção a dinamização da relação professor-aluno via e-mail e Orkut e a diversidade de fontes de informação que essas tecnologias, sobretudo a internet, oferecem para pesquisas de docentes e discentes.

O que é um BLOG? from iGovSP on Vimeo.


Foco no estudante - Especialmente no caso dos estudantes do ensino fundamental e médio, esse tipo de experiência tem feito eco ao pensamento de Carl Rogers (1973) ao falar do ensino centrado no estudante e em seu universo. Como informa uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo, “para conseguirem a atenção das crianças, instituições de ensino se adaptam à realidade do seu público-alvo, acostumado, desde cedo, a ter acesso a ferramentas tecnológicas”. Com isso, os alunos têm demonstrado maior entusiasmo para as aulas e, de quebra, os pais podem acompanhar pela rede a produção dos filhos.
Os cursos de graduação também têm investido pesado nas tecnologias. Mas a grande surpresa é ver como elas repercutem nos cursos de pós-graduação para professores, embora caibam – especialmente nesses casos – considerar que há também desvantagens na utilização dessas tecnologias em sala de aula.
As experiências têm mostrado que as tecnologias têm afastado os alunos do contato físico entre eles nos trabalhos em grupo e, eventualmente, estimulado a dispersão e a desatenção em relação ao que lhe é solicitado, já que o e-mail do colega ou do professor pode compensar seu descuido. No âmbito avaliativo, o maior problema é a “ciber-cola”: uma sondagem apressada em sites de busca como o Google ou o Yahoo! e pronto: eis o trabalho a ser entregue ao professor.
No entanto, o uso das tecnologias em sala de aula é uma conseqüência da sua presença no cotidiano. Parodiando McLuhan (1964), que nos anos 60 disse que “os meios de comunicação são extensões do homem”, considero a presença das tecnologias no processo ensino-aprendizagem é uma conseqüência do seu uso na vida fora da sala de aula. Sendo assim, é difícil fugir desse paradigma, mesmo que seja para questioná-lo e tentar entender o tipo de mundo que estamos criando.
Buscando exatamente essa reflexão, realizei há pouco menos de um ano algumas experiências com alunos de cursos de graduação e de pós-graduação de escolas de São Paulo. Nesses espaços temos elaborado trabalhos com tecnologias e suportes digitais: blogs, fotos e vídeos a serem disponibilizados na internet. De forma geral, a experiência revelou-se extremamente grata tanto para mim como para os alunos.

Tutorial BLOG passo a passo from iGovSP on Vimeo.


Blogs e cia. - Estamos caminhando e ainda aprendendo, diga-se de passagem, da forma como eu realmente acho que deve funcionar o processo ensino-aprendizagem: eu e eles, eu com eles e eles comigo. Mas de uma coisa acho que podemos ficar certos: criar um blogs não é tão simples quanto se pensa.
Ter o mouse na mão é o mais fácil. A idéia na cabeça não é tão difícil... O grande desafio para criar e manter um blog, acho que quanto a isso eu e os meus alunos temos um consenso, é ter repertório para articular as diferentes idéias em nome daquilo que costumamos denominar “produção do conhecimento”. Nesse desafio a internet, os blogs, os fotologs e os videologs são apenas instrumentos.
Castells (2003), ao falar sobre tecnologias e educação, observa que a divisão social promovida pela internet não é aquela entre quem tem e quem não tem acesso a ela, mas entre aqueles que têm condições de utilizar o conhecimento que ela disponibiliza para “aprender a aprender” e aqueles que não o têm. Portanto, ter um blog ou afim pode realmente ser uma grande brincadeira disponibilizada a partir das tecnologias que hoje nos rodeiam, mas pode ser também um espaço muito sério para conhecer e produzir conhecimento, que é, enfim, o objetivo de qualquer bom projeto educacional.
A novidade trazida pela aplicação das tecnologias em sala de aula não é o seu uso e ou os seus suportes, mas o que podemos aprender e construir com suas ferramentas. Se conseguirmos utilizá-las para refletir e discutir sobre um mundo melhor, mais justo e ambientalmente sustentável, utilizando-as como meios de “aprender a aprender”, estaremos num caminho coerente.
Utilizar as tecnologias que estão tecnicamente disponíveis no cotidiano e trabalhá-las em sala de aula como um estímulo à reflexão, à criação e à humanização é, certamente, um dos caminhos para possibilitar a educação e o aprimoramento das ferramentas para a construção desse futuro. Redimensionando o invento que Gutenberg desenvolveu há muitos séculos, estamos – eu e meus alunos – nos arriscando em novas descobertas e dúvidas, mas aprendendo. Entre erros a acertos compartilhamos as nossas tentativas de aprender o bê-a-bá... Ou melhor: o blá-blé-bli e bló dos blogs! E isso é educação.

Referências bibliográficas
ARRAIS, Daniela. Escolas usam games e blogs para ensinar. Folha On Line. São Paulo, 30 de agosto de 2008. Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/folha/informatica/ult124u439546.shtml. Acessado em: 30 de setembro de 2008.
CASTELLS, Manuel. Sociedade em Rede. IN: MORAES, Denis de (org). Por uma outra comunicação. Rio de Janeiro: Record, 2003.
CONTINUUM: Revista do Itaú Cultural: Histórias de Deslocamentos. São Paulo, 15 de outubro de 2008. Disponível em: http://www.itaucultural.org.br/bcodemidias/000915.pdf. Acesso em: 20 de outubro de 2008.
McLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 1964.
ROGERS, Carl R. Tornar-se Pessoa. Lisboa: Moraes Editores (Martins Fontes), 1973.