quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Educação, progresso e pessoas

Enio Moraes Júnior

Os movimentos que têm ocorrido em todo o mundo em defesa da qualidade da Educação, a exemplo das manifestações acadêmicas em Lisboa neste mês de novembro de 2009, têm trazido à tona diversas questões diretamente relacionadas ao ensino, mas que também dizem respeito ao progresso sócio-econômico das comunidades e dos países e à felicidade das pessoas.
Segundo o jornal português Correio do Minho, “os estudantes universitários pretendem defender ‘uma acção social mais justa’ e um ‘maior investimento no Ensino Superior que concretize a vontade dos alunos de terem um ensino de qualidade, factor fundamental para o desenvolvimento do país”. E isso é coerente. Mas ainda assim, é bom que tenhamos claro que a defesa da qualidade do ensino – seja em que nível for – deve nos colocara sempre diante de uma questão central: por que precisamos da Educação?
Essa parece uma pergunta de resposta óbvia, mas é uma questão diante da qual governos, cidadãos ou até mesmo aqueles que estão mais diretamente no espaço escolar – professores e alunos – nem sempre conseguem se colocar. Em parte, essa dificuldade de nos defrontarmos com ela aparece porque o processo de ensino-aprendizagem ocorre muito cedo em nossas vidas: mal nascemos e já nos embrenhamos nele bem antes dos bancos escolares.

Educação e escola – A família, a comunidade e a cultura são espaços iniciais e importantes de educação. No entanto ao institucionalizar-se socialmente como espaço privilegiado para a formação do indivíduo para viver e agir em sociedade, a educação deve servir para assegurar o compromisso desses indivíduos com o outro, com os direitos humanos e com a cidadania. Nesse sentido, a educação vai encontrar uma acepção mais formal no conceito de escola.
Foi o conceito de trabalho, aliás, que trouxe uma distinção entre educação e escola que ficou mais clara a partir dos anos 60 do século XX. Enquanto educação referia-se ao constante processo de aprendizado inerente à qualidade humana no dia-a-dia de suas relações sociais, seja na família, na rua ou no trabalho, a escola referia-se a um tipo específico de apreensão do conhecimento formalizado e organizado.
É a concepção de trabalho, pois, que vai diferenciar educação e escola. Enquanto nos períodos primitivos da história da humanidade a educação confundiu-se com as formas de intervenção do homem sobre a natureza para servi-lo, o trabalho, na Antiguidade, tanto na civilização grega como romana, os dois conceitos passam a servir diferentemente a cada classe social. Enquanto os nobres recebiam uma educação específica nas escolas, ligadas à oratória e à política, por exemplo, os servos eram educados pelo e para o próprio trabalho. Na Idade Média, a diferenciação continuou entre nobres e plebeus.
Já na Idade Moderna, com o desenvolvimento do Capitalismo e a conseqüente urbanização das cidades, a escola, incorporada aos valores da burguesia, passou a funcionar também como forma de adaptação do trabalhador ao mercado. Na perspectiva do capital, a escola passou a ser entendida como forma dominante de educação.
Assim, muito do propósito de democracia, de distribuição igualitária de bens e riquezas e felicidade a escola não realizou. A história da Contemporaneidade é a história dos conflitos ungidos nas lutas por esses propósitos. A história do Socialismo, a rigor, é mais do que qualquer outra, essa história.

Percepção e ação – E para que serve então, hoje, a Educação? Ela serve, pois, para nos fazer perceber essas contradições e conduzir a ações no sentido de desfazê-las e, enfim, nos fazer mais felizes na vida comunitária. É essa preocupação que deve ocupar o centro dos movimentos que têm ocorrido em todo o mundo em defesa da qualidade da Educação como também as preocupações de todo indivíduo que tome parte nesse tipo de evento.
Seja em que sentido for, a educação deve atender ao nosso compromisso humano de sermos felizes no mundo e fazermos felizes as pessoas – de todo o mundo – com as quais convivemos. E esse é, por excelência, o sentido da Escola e da defesa da sua qualidade.
Manifestar-se por uma educação de qualidade é, pois, reinvidicar uma ação social mais justa e a qualidade do ensino para si, mas também entender-se compromissado com esse agir no sentido do outro. Isso significa dizer que no centro de quaisquer discussões sobre a qualidade da educação deve estar o indivíduo e a cidadania, e não interesses particulares e modelos econômicos.